quarta-feira, 18 de maio de 2011

Cartas ou coisas do género




Escrevia o poeta que as "cartas de amor são ridículas", mas hoje apetece-me. Não escrever alguma, mas apenas falar sobre as ditas.

Não que tenha escrito muitas, mas o que tem saído cá para fora acaba por se tornar em carta sem destinatário presente. Talvez sejam quase manifestos da minha alma desconfortável com o sentimento a que chamam amor.

Tenho andado com a sensação de que me falta algo, uma espécie de carência que não consigo explicar e resolvi que "Não pode ser Princesa!". Tenho que me concentrar em mim e se há alguém que merece uma carta de amor, sou eu! Não tenho que as escrever a mais ninguém sem que as tenha escrito a mim própria. Certamente será uma aventura nova para mim, mas também pode vir a ser mais uma libertadora experiência de escrita. Logo saberei o resultado. Por agora restam-me
"Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos
"
que me rodeiam e descobrir o que realmente quero destas cartas.

Todas as Cartas de Amor são Ridículas

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)


Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

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